2009-01-19

Livro: Comer, rezar, amar

Domingo retrasado, enquanto passava em frente a uma pequena livraria fechada, vi na vitrine a capa deste livro, Comer, rezar, amar, da Elizabeth (ou mais intimamente, Liz) Gilbert.

comer rezar amar livro
Admito que foi o nome que mais me chamou a atenção, afinal, dos três verbos eu não conjugo apenas o do meio. Mas como a livraria estava fechada, nenhum interesse maior me passou pela cabeça.

Mais tarde, num Shopping Center, vou em uma livraria aberta, procurando por outro livro que eu queria ler. Mas este, infelizmente está esgotado. Dando uma volta, vejo de novo o Comer, Rezar, Amar, e resolvo dar uma olhada na contra-capa e nas orelhas. Acho interessante, e começo a dar uma lida rápida pelos capítulos. Resolvo arriscar e compro.

Não me arrependi. Terminei de lê-lo ontem. O livro é muito bem escrito, e os capítulos são em sua maioria, como posts de um blog, curtos, concisos e deliciosos de serem lidos, misturando equilibradamente doses de humor - por vezes sarcástico e cínico -, drama e espiritualidade (que eu acho interessante e curioso, mas não é exatamente a minha praia).

Uma pequena descrição do livro, que eu peguei da Publifolha:

Elizabeth Gilbert estava com quase trinta anos e tinha tudo o que qualquer mulher poderia querer, mas em vez de sentir-se feliz e realizada, sentia-se confusa, triste e em pânico. Enfrentou um divórcio, uma depressão debilitante e outro amor fracassado. Até que decidiu tomar uma decisão radical: livrou-se de todos os bens materiais, demitiu-se do emprego, e partiu para uma viagem de um ano pelo mundo - sozinha.

"Comer, Rezar, Amar - A Busca de Uma Mulher Por Todas as Coisas da Vida na Itália, na Índia e na Indonésia", da editora Objetiva, é a envolvente crônica desse ano. Em Roma, estudou gastronomia, aprendeu a falar italiano e engordou os onze quilos mais felizes de sua vida. Na Índia, com a ajuda de uma guru indiana e de um caubói texano, dedicou-se à exploração espiritual, comungou com o divino e viajou durante quatro meses. Já em Bali, exercitou o equilíbrio entre o prazer mundano e a transcendência divina. Tornou-se discípula de um velho xamã, e também se apaixonou da melhor maneira possível: inesperadamente.

Escrito com ironia, humor e inteligência, o best seller de Elizabeth Gilbert é um relato sobre a importância de assumir a responsabilidade pelo próprio contentamento e parar de viver conforme os ideais da sociedade. É um livro para qualquer um que já tenha se sentido perdido, ou pensado que deveria existir um caminho diferente, e melhor.


Geralmente ao ler um livro, eu acabo marcando algumas passagens que considero interessantes ou apenas engraçadas. Aqui vão algumas delas:

Sobre amores, ilusões e como diria a propaganda do Serenata de Amor, projeções:

David e eu nos conhecemos porque ele estava atuando em uma peça baseada em contos meus. Ele fazia um personagem que eu havia inventado, o que é de certa forma revelador. No amor desesperado é sempre assim, não é? No amor desesperado, nós sempre inventamos os personagens dos nossos parceiros, exigido que eles sejam o que precisamos que sejam, e depois ficando arrasados quando eles se recusam a desempenhar o papel que nós mesmos criamos.


Sobre limites:

Além disso, tenho problemas de limites com os homens. Ou talvez não seja justo dizer isso. Para ter problemas com limites, é preciso primeiro ter limites, certo? Mas eu sou inteiramente tragada pela pessoa que amo. Sou como uma membrana permeável. Se eu amo você, eu lhe dou tudo que tenho. Dou-lhe o meu tempo, a minha dedicação, a minha bunda, o meu dinheiro, a minha família, o meu cachorro, o dinheiro do meu cachorro, o tempo do meu cachorro – tudo. Se eu amo você, carregarei para você toda a sua dor, assumirei por você todas as suas dívidas (em todos os sentidos da palavra), protegerei você da sua própria insegurança, projetarei em você todo tipo de qualidade que você na verdade nunca cultivou em si mesmo e comprarei presentes de Natal para sua família inteira. Eu lhe darei o sol e a chuva e, se não estiverem disponíveis, darei-lhe um vale de sol e um vale de chuva. Darei a você tudo isso e mais, até ficar tão exausta e debilitada que a única maneira que terei de recuperar minha energia será me apaixonar por outra pessoa.


(Já podem imaginar eu gargalhando, lendo: "Se eu amo você, eu lhe dou tudo que tenho. Dou-lhe o meu tempo, a minha dedicação, a minha bunda...")

Sobre Buda assoprando a poeira dos olhos alheios:

A tradição budista tem uma história sobre os momentos que se seguiram à transcendência de Buda rumo à iluminação. Quando - depois de 39 dias meditando — o véu da ilusão finalmente foi retirado, e o verdadeiro funcionamento do universo foi revelado ao grande mestre, dizem que ele abriu os olhos e disse, no mesmo instante: "Isso não pode ser ensinado." Em seguida, porém, mudou de idéia, e decidiu que sairia pelo mundo, sim, e tentaria ensinar a prática da meditação a um pequeno grupo de discípulos. Ele sabia que seus ensinamentos só poderiam ajudar (e interessar) a uma ínfima porcentagem de pessoas. A maior parte da humanidade, disse ele, tem os olhos tão fechados pela poeira da ilusão que jamais verá a verdade, por mais que se tente ajudá-la. Alguns outros (como o pai de Sean, talvez) têm os olhos já tão naturalmente claros, e são tão tranqüilos, que não precisam de nenhum tipo de instrução ou ajuda. Mas existem também aqueles cujos olhos estão só ligeiramente fechados pela poeira e que, com a ajuda do mestre certo, poderiam aprender um dia a ver com mais clareza. O Buda decidiu que se tornaria o professor dessa minoria - "aqueles com pouca poeira".


mulher assoprando a lua
Sobre o que mais nos preocupa:

E então me lembro de uma história que minha amiga Deborah, a psicóloga, me contou certa vez. Durante os anos 1980, a cidade da Filadélfia perguntou-lhe se ela poderia ser voluntária para ministrar aconselhamento psicológico a um grupo de refugiados do Camboja - os chamados boat people - recém-chegados à cidade. Deborah é uma psicóloga excepcional, mas ficou terrivelmente intimidada por essa tarefa. Aqueles cambojanos haviam sofrido o pior que os seres humanos são capazes de infligir a outros seres humanos - genocídio, estupro, tortura, fome, assassinato de parentes diante de seus olhos, tudo isso seguido por longos anos em campos de refugiados e perigosas viagens de navio para o Ocidente, durante as quais pessoas morriam e cadáveres eram lançados aos tubarões -, então que tipo de ajuda Deborah poderia oferecer a essas pessoas? Como era possível para ela entender a extensão do seu sofrimento?

- Mas você sabe sobre o que essa gente toda queria falar quando conseguia encontrar psicólogos? - perguntou-me Deborah.

Era só: Conheci um cara, quando estava morando no campo de refugiados, e a gente se apaixonou. Achei que ele me amasse de verdade, mas depois a gente foi separado em navios diferentes e ele ficou com a minha prima. Agora está casado com ela, mas diz que me ama de verdade, e fica me ligando o tempo todo, e sei que deveria dizer para ele ir embora, mas ainda o amo e não consigo parar de pensar nele. E eu não sei o que fazer...

É assim que a gente é. Coletivamente, como espécie, é essa a nossa paisagem emocional. Certa vez, conheci uma velha senhora que tinha quase 100 anos de idade, e ela me disse: "Só existem dois assuntos pelos quais os seres humanos brigaram em toda a história: Quanto você me ama? e Quem é o chefe?" Todo o resto é, de alguma forma, administrável. Mas essas duas questões, o amor e o controle, são a perdição de todos nós, fazem-nos tropeçar e provocam guerras, tristeza e sofrimento.


Sobre uma pequena fábula, do gato no poste:

Os indianos desta região repetem uma fábula de alerta sobre um grande santo que estava sempre cercado, em seu ashram, por devotos leais. Durante horas por dia, o santo e seus seguidores meditavam sobre Deus. O único problema era que o santo tinha um gato jovem, uma criatura irritante, que costumava atravessar o templo miando, ronronando e incomodando todo mundo durante a meditação. Então o santo, com toda sua sabedoria prática, ordenou que o gato fosse amarrado a um poste do lado de fora durante algumas horas por dia, apenas enquanto durasse a meditação, para não incomodar ninguém. Isso se tornou um hábito - amarrar o gato ao poste e, em seguida, meditar sobre Deus - mas, com o passar dos anos, o hábito se consolidou, transformando-se em um ritual religioso. Ninguém conseguia meditar a menos que o gato fosse amarrado ao poste primeiro. Então, um dia, o gato morreu. Os discípulos do santo entraram em pânico. Foi uma enorme crise religiosa - como poderiam meditar agora sem um gato para amarrar no poste? Como conseguiriam alcançar Deus? Em suas mentes, o gato tornara-se o meio.


gato brincando
(Eu teria resolvido a crise comprando outro gato...)

Sobre desejos e uma forma de satisfazê-los:

Eu precisava fazer alguma coisa em relação àquele meu desejo, então me levantei, fui até a cozinha de camisola, descasquei meio quilo de batatas, aferventei-as cortei-as, fritei-as na manteiga, salguei-as generosamente e comi tudo até o ultimo pedaço - sem nunca deixar de perguntar ao meu corpo se ele faria a gentileza de aceitar a satisfação de meio quilo de batatas fritas em vez do prazer proporcionado pelo sexo.

Somente depois de comer cada pedaço da comida foi que meu corpo respondeu: "Não vai dar, gata."

Então tornei a entrar na cama, suspirei de tédio e comecei a...

Bom. Uma palavrinha sobre masturbação, se me permitem. Algumas vezes, ela pode até dar uma mãozinha (perdoem-me o trocadilho), mas em outras ocasiões pode ser tão insatisfatória que só faz você se sentir pior no final. Depois de um ano e meio de celibato, depois de um ano e meio gritando meu próprio nome em uma cama de solteiro, eu estava ficando um pouco enjoada daquele esporte. Mesmo assim, nessa noite, meu estado era tal que... o que mais eu podia fazer? As batatas não tinham funcionado. Então, mais uma vez, dei prazer a mim mesma. Como sempre, minha mente percorreu seu arquivo sexual à procura da fantasia ou da lembrança exata que ajudaria o trabalho a ser mais rapidamente concluído. Nessa noite, porém, nada estava funcionando muito - nem os bombeiros, nem os piratas, nem aquela cena-coringa do safadinho do Bill Clinton que geralmente resolve a parada, nem mesmo os cavalheiros vitorianos se acercando de mim na sala de estar com sua força-tarefa de jovens nubentes. No final das contas, a única coisa que me satisfez foi quando, relutante, deixei minha mente ser tomada pela idéia do meu amigo brasileiro subindo na cama comigo... em cima de mim...

Em seguida, dormi.


(Batata frita nem sempre resolve, huhuhu. Mas falando sério - ou não - tem vez que não tem fantasia que resolva. Mas basta pensar em uma certa pessoa, que... plim!)

E finalmente, a última citação.

Sobre as palavras e seu poder:

Os sábios iogues dizem que a dor da vida humana é causada pelas palavras, assim como toda a alegria. Nós criamos palavras para definir nossa experiência, e essas palavras trazem consigo emoções que nos sacodem como cães em uma coleira. Nós somos seduzidos por nossos próprios mantras (Eu sou um fracasso... Estou só... Sou um fracasso.,. Estou só...), e nos transformamos em monumentos a esses mantras. Passar algum tempo sem falar, portanto, é uma tentativa de se desvencilhar do poder das palavras, de parar de nos asfixiar com as palavras, de nos libertar de nossos mantras sufocantes.


Se você está em dúvida e quiser ler o começo do livro, neste link da folha tem um pdf.

Em tempo: apesar de eu não ter ouvido falar antes do livro, parece que ele é bem famoso até. Ok, na capa está estampado "mais de 4 milhões de exemplares vendidos", mas eu não confio muito nesses números não... De qualquer modo, parece que a eterna pretty woman Julia Roberts vai viver o papel da Liz (autora e protagonista), numa adaptação para o cinema. Tenho minhas dúvidas se isso vai prestar...

6 comentários:

Ana P. disse...

Já ouvi falar desse livro e cansei de vê-lo na livraria, mas sempre achei que tinha cara de auto ajuda...

Não li os textos... estou com mini sono demais para conseguir ler qquer coisa agora. Posso ler amanhã???

Aliás... vc recomenda MESMO? Penso em comprar...

Andarilho disse...

Não é um livro de auto-ajuda. É um relato pessoal da autora, que assim como toda história, pode ser visto como apenas uma história ou como um ensinamento: depende do ouvinte, ou neste caso, do leitor.

E eu recomendo. É uma leitura fácil, rápida e divertida. Não um tratado filosófico-acadêmico.

Márci disse...

Olha...eu li as passagens todas. E muito me interessou...Quem sabe depois de eu ler Twilight.

Se bem que meio que dá medo de ser essas coisas....vai que eu penso em fazer o mesmo....vender tudo e ir para a ...Índia.

Andarilho disse...

Bem, se um dia vc for pra India, não esquece de atualizar o blog de vez em quando, contando as histórias, hehehe. ;P

Ju ♥ disse...

estou com medo de ver o filme!
li e adorei o livro.

Ben Oliveira disse...

O livro e o filme são ótimos! Comecei a ler Comprometida, da mesma autora e estou gostando. Hoje comprei um outro livro da Elizabeth Gilbert, espero que seja bom.